sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Em Nome do Pai (uma carta para Rivaldo)

 Caro Rivaldo,

Num dia de Janeiro deste ano, ao abrir os jornais do dia ou os habituais sites da internet, todos referiam com maior ou menor destaque, a noticia, que tu, aos 39 anos, ias jogar para um clube de que eu nunca tinha ouvido falar, do Girabola, o quase incógnito campeonato Angolano!
Muitos logo disseram que "arrastas" demasiado a tua carreira.
Mas eu digo-te, ainda bem continuas! Com certeza que não é por dinheiro, a glória a que chegas-te em Barcelona com certeza que se traduziu eu igual sucesso para a tua conta bancária.
Depois de jogares em clubes como o Palmeiras, Deportivo da Corunha, FC Barcelona e AC Milan, de onde saíste com 31 anos, podias ter ido pelo caminho mais fácil e dito os habituais, "retiro-me enquanto ainda estou no auge" ou "já não tenho prazer em treinar". Mas não, continuas-te!  E sabes uma coisa? Fizeste bem! 
Jogas-te na Grécia, no Uzbequistão, voltas-te ao teu Brasil e agora vais para o Girabola. Eu, se tivesse o teu talento, faria como tu!
Quero acreditar que continuas a jogar porque amas o jogo. Aconteceu jogares no Camp Nou e no San Siro, mas estou certo que continuarias a disfrutar da mesma maneira se nunca tivesses saído do anónimo campo de Gonzagão, lá no Nordeste Brasileiro, onde jogavas quando ainda eras o "Vado do Seu Romildo", o moleque pobre e subnutrido que jogava descalço, ou talvez jogues em memória do teu Pai "Seu Romildo", que com grande sacrifício te ofereceu as tuas primeiras chuteiras, quando já tinhas 13 anos!
Quando chegas-te ao Super-Depor, eu nunca tinha ouvido falar de ti, a verdade é que só reparei quando começas-te a fazer aqueles remates de fora da área, fazias aquele movimento só teu, ficavas suspenso no ar, a bola saia-te do pé esquerdo e, talvez agradecida pela forma delicada como a tratavas, mantinha-se ali, a um palmo da relva e já todos sabiam que ia entrar na baliza juntinho a um dos postes, estivesse na porteria um guarda-redes da 2ª divisão num jogo da Copa, ou fosse o soberbo "Gigi" Buffon em partida da Champions. 
Quero dizer-te também, que por causa desses remates, foste o culpado de alguns olhares mortíferos sobre mim, quando eu, numa total ausência de bom senso, nas peladinhas com amigos, te tentava secretamente "imitar" nos remates de longe, e a bola, infinitamente menos minha amiga que tua, insistia em continuar a  sair muito por cima da barra ou mais próximo da linha lateral que da baliza!
É evidente que não ousei sequer  tentar marcar de bicicleta de fora da área, como fizeste naquele jogo com o Valência em que marcas-te os três golos do Barcelona, porque sei bem que esse golo não foi real, que fizeste um pacto com o fantasma de Houdini e nos iludiste a todos. Com certeza que era um holograma produzido com os melhores efeitos especiais dos estúdios de Hollywood e que o filmas-te durante meses para atingir aquele nível de perfeição em cada movimento! Que o golo tenha sido marcado a dois minutos do fim de um jogo que estava empatado 2-2, só reforça a ideia de que se tratava de um guião épico do Spilberg!
Por isso te digo, continua a jogar, se possível para sempre! E se algum dia, lá no Girabola, te disserem que estás muito velho, não te preocupes! Tenho um lugar guardado para ti na minha equipa, nas futeboladas de 6ª feira à noite, e lá, ao contrario do que achavam alguns treinadores que não te compreenderam, poderás abusar dos golos do meio campo, dos remates de "rabona" (tu dizes de "letra", não é?), das "cuecas" (o que tu chamas "canetas"), dos dribles impossíveis, dos domínios em que a bola "congela" no teu pé e dos chapéuzinhos ao guarda-redes.
E quando esse dia chegar, se não te importares, vais explicar-me muito devagarinho, de que maneira tenho que inclinar o corpo e "bater" na bola para que ela saia assim, a um palmo do chão e entre na baliza a "raspar" o poste!


Um abraço forte deste teu amigo,
"Rivaldista" para sempre.


(foto: Getty Images)

2 comentários:

  1. Há uma história, deliciosa, sobre Rivaldo. Quando ele era miúdo caiu-lhe um muro (!) em cima da perna direita. Como ele adorava jogar à bola só podia chutar com o esquerdo, e assim tornou-se naquela máquina.

    Tu, como Rivaldista, confirmas?

    @braços!

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    1. Carissimo @Treinador de Bancada. Essa não conhecia! Qual é a fonte? As histórias que li pela net são que o Rivaldo era de uma familia realmente muito pobre, só teve umas chuteiras aos 13 anos, o pai morreu atropelado por um autocarro quando ele tinha 16 e só não desistiu do futebol por força da mãe e porque esse era o sonho do pai! E pelos vistos fazia 20 km a pé para ir aos treinos até os directores do clube lhe começarem a pagar o passe! Abraço.

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