quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

O Meu Pé Esquerdo

Entro no carro, ligo o rádio, "....notícia do dia.....Domingos Paciência já não é treinador do Sporting! Para o seu lugar é promovido, o até agora treinador dos juniores, Ricardo Sá Pinto...."
Um sopro,....lá vamos nós outra vez, penso eu, adivinhando a "balbúrdia" que se avizinha, e sem saber se ficar triste ou contente......


No início da década de 90, eu arriscava-me a ser desses poucos portugueses, mesmo os que não ligam "à bola", que não torcem por nenhum dos três grandes. Os anos de ouro do Desportivo de Chaves não tinham deixado espaço para mais. Nem a influência familiar vermelha, nem o recente calcanhar de Madjer me tinham atraído para a "causa".
Do Sporting, sentia admiração por uns adeptos que se mantinham fiéis e enchiam o estádio apesar de não ganharem o campeonato há muitos anos.
Enquanto o mundo prestava mais atenção a uma estrela búlgara em ascensão, Hristo Stoichkov, que tinha chegado a Barcelona para fazer história no Dream-Team de Johan Cruyff, chegava a Alvalade, silenciosamente, vindo do mesmo país , um jogador com o nome de Krassimir Guenchev Balakov, de 24 anos.
Mas depois de Radi, eu já sabia o que podia valer um búlgaro chegado de forma quase anónima e este, esquerdino, cabelo encaracolado e com o "10" nas costas, fazia-me lembrar alguém!
Não me enganei, e por "culpa" dele, de camisola verdibranca da UMBRO com os dizeres "bonança" vestida comecei a prestar atenção aos jogos do clube com o escudo do Leão.
Os livres directos, os penaltis à Panenka, as arrancadas desde o meio campo à Maradona. Golos de pé esquerdo, pé direito, de dentro e de fora da área, passes, assistências e tabelinhas. Um verdadeiro compêndio do futebolista total!
Espero até que a memória me atraiçoe e não tenha sido mesmo ele a marcar de canto directo ao meu Desportivo.

Durante aquelas épocas subiram com ele ao relvado outros Grandes como Ivkovic, Valckx, Cherbakov, Juskowiak, Figo, Naybet, Marco Aurélio, Carlos Xavier, Oceano, Paulo Sousa, Iordanov, Amunike ou Sá Pinto.
Ai, que saudades! Inacreditavelmente, para a estatística fica apenas aquela Taça de Portugal em 95, mas para mim, e com certeza para muitos outros ficou a recordação de um irresistível futebol, praticado por onzes com uma quantidade de gente que "sabia jogar à bola" difícil de igualar. Basta lembrar o que fazia o holandês, que era central, com a bola nos pés!
Quando o mágico búlgaro partiu, empurrado pela arrogância de C. Queiroz, eu, tal como ele, já tinha o verde a correr-me nas veias.
Nos alemães do Estugarda também não tardou em fazer história com o "Das magische Dreieck", o "triângulo mágico" que formou com Fredi Bobic e Giovane Elber.
E não era preciso perceber uma palavra de alemão para saber o que diziam os comentadores da Eurosport, quando gritavam, depois de mais uma jogada de génio: "klasse spiele von Krassimir Balakov".Eu fiquei, mas continuei a procurá-lo. E com certeza que o encontrei, muitas vezes, no futebol romântico do Pedro Barbosa, vi-o naqueles livres do André Cruz e até, algumas vezes, na subtileza do pé esquerdo do Miguel Veloso. Agora, vou a Alvalade com a crença de encontrá-lo nos passes inteligentes do chileno Matías e principalmente na inteligência do futebol do merecedor herdeiro da "10", o russo Marat.
E é por isso que para além do Chaves, também sou do Sporting, e por muitos dirigentes "autistas", por muita contratação absurda e "tiros no pé" que existam, continuarei. Porque faz parte de mim..

Agora dizem-me que o clube está falido, que um dia vai fechar. Então, mas não sabem que se esse dia chegasse, eu, e não-sei-quantos mil mais, fundaríamos no dia seguinte o Sporting 1906, e se por acaso esse acabasse, os nossos filhos o ressuscitariam com o nome de Sporting És a Nossa Fé, e que depois desse, daqui a muitos anos, haveria quem erguesse o Sporting És o Nosso Grande Amor!
É por isso que desencantados, a cada crise, juramos não ver mais os jogos, não voltar a Alvalade, e depois com o aproximar do jogo da Liga Europa a umas incómodas 6 da tarde, inventaremos uma repentina dor de cabeça no trabalho, e nos apetecerá parar para tomar um café que sabemos, vai durar duas horas. É por isso que se ganharmos esse jogo nos esqueceremos das juras anteriores. É também por isso que as repetiremos se perdermos. E no fim-de-semana, com o nervoso da hora do jogo a chegar, diremos um "já volto" e rumaremos a Alvalade....porque sim, porque sabemos que lá estarão, á nossa espera, os Violinos Jesus Correia, Vasques, Albano, Peyroteo e Travassos, o "Chirola" Yazalde, o Damas, o Manuel Fernandes e eu lá encontrarei........o Meu Pé Esquerdo, esse mesmo, o de Krassimir Balakov!
(Благодаря Балъков!)





8 comentários:

  1. Fortíssimo post.

    Também me lembro dos anos 90, os anos da Grande Seca. E lembro-me de ter estado no Jamor, para ver essa geração, que claramente merecia mais, ser finalmente coroada!

    É por isto que o Sporting nunca acabará.

    Um abraço

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  2. Pois o meu Sportinguismo foi-me transmitido por um Transmontanao de Pedras Salgadas que idolatrava o futebol dos 5 violinos e, apesar dele já ter partido, eu cá fiquei para perpetuar o seu amor cego aos Leões de Alvalade.

    Um Abraço e tudo de bom para logo apesar do frio intenso.

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  3. Excelente post.... parabéns!!!
    ISTO É O SPORTING....
    PP

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  4. Eu vi Krasimir Guenitchev Balakov a marcar golo de livre ao Tirsense em Alvalade, estando na baliza Vladan, o irmão de Stojkovic. Grande golo, à mestre, que me deixou sem respiração! E depois vi a marcar outro do meio campo ao ÁGuias de Carnide! Lindo! "Bala" era grande, dos melhores que vi jogar!

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  5. SHOW. Grande jogador e enorme texto. Sá só precisa de entender - e entende - tudo o que aqui se escreve: o sportinguista aguenta não ganhar mas não tolera mau futebol. Sem isso as idas ao estádio tornam-se um suplício difícil de aguentar. Sá pode não vingas mas desta vez nenhum sportinguista poderá encontrar desculpas na falta de amor ao clube por parte de quem o treina. Espero que vença pois seria muito triste ver um tão grande leão sair pela porta pequena. Sem escape: vencer ou morrer !

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  6. Ui, que agora tocou mesmo lá no fundo. Lembro-me tão bem dos anos de seca, oh se lembro, eu um Leão do Norte de Portugal a estudar numa Coimbra infestada por portistas e benfiquistas. Não foi fácil mas fui estóico e sobrevivi.

    E, por incrível que pareça, tinha sempre uma fé enorme que as coisas iam melhorar.

    Como agora, com o Sá Pinto...

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  7. Que grande post.
    Fez-me arrepiar!!! Isto é ser sportinguista não há muito mais a dizer...só a sentir.
    Obrigada
    Ass: Leoa Ferrenha do Norte

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  8. Muito bom. Revejo-me e praticamente tudo o que disse, com a excepção do Chaves claro :).
    Sendo ainda miúdo adorava Balakov, era o meu ídolo depois desesperei com a forma com que a maioria dos adeptos tratou o melhor jogador português do últimos anos a actuar em Portugal, o Capitão, o Maestro Pedro Barbosa, para mim o melhor de sempre.
    Agora o único jogador com indiscutivel qualidade acima da média é Izmailov, a bola sai sempre "redonda" dos seus pés, mas infelizmente não podemos contar com ele.
    Falta ao Sporting jogadores deste calibre e ter deixado saír o João Moutinho, foi uma aberração...

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